
A Reforma Tributária deve entrar em definitivo na pauta do Congresso Nacional em 2020. Existem duas propostas em tramitação: a PEC 45, da Câmara dos Deputados, baseada nos estudos do economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), e a PEC 110/2019, do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), que recupera o relatório do ex-deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR).
Em fevereiro, deverá ser criada uma Comissão Mista para debater os dois projetos e formatar um texto único para votação em ambas as casas legislativas. Diferente do que foi anunciado, o governo não chegou a enviar uma proposta ao Congresso, mas anunciou que deve tratar o tema de forma fracionada, incorporando medidas aos dois projetos. Como representante dos Auditores-Fiscais da Receita Federal, o Sindifisco Nacional tem acompanhado e participado do debate sobre a Reforma Tributária, tanto em audiências na Câmara e no Senado quanto junto a think tanks e organizações da sociedade civil, como a Fiesp e o CCiF. A entidade elaborou um conjunto de propostas para o aperfeiçoamento do sistema tributário brasileiro, apresentado pelo presidente Kleber Cabral no Fórum Nacional Tributário – Font, realizado pelo Sindifisco, no ano passado, em Brasília.
O Sindifisco vem pontuando que nenhuma das propostas em debate trará redução da carga tributária, maior justiça fiscal ou simplificação “num passe de mágica”. Pelo contrário, durante o período de transição, dois sistemas coexistirão.
A necessidade de uma reforma tributária é consenso entre especialistas, parlamentares e autoridades fiscais. O Brasil ocupa a 184ª posição entre 190 países no ranking que calcula o tempo gasto anualmente para o cumprimento das obrigações tributárias: são necessárias 1.958 horas ao ano. No Canadá, são apenas 131 horas, para se ter uma ideia. Para o Sindifisco, além de simplificar, a reforma precisa alterar a estrutura do sistema tributário, no sentido de promover maior justiça fiscal, observando os princípios estabelecidos na Constituição de 1988.
Nas discussões de que participa, Kleber Cabral tem apontado os desafios estruturais que precisam ser enfrentados: sonegação, extinção da punibilidade dos crimes contra a ordem tributária após pagamento do valor devido, programas de refinanciamento, contencioso administrativo fiscal lento e gastos tributários (benefícios e desonerações).
O Sindifisco vem pontuando que nenhuma das propostas em debate trará redução da carga tributária, maior justiça fiscal ou simplificação “num passe de mágica”. Pelo contrário, durante o período de transição, dois sistemas coexistirão. E se, do ponto de vista teórico, a PEC 45 é mais completa, em termos operacionais, a PEC 110 seria mais viável, já que a reforma será feita com o “carro em movimento”, dentro de um intrincado sistema socialmente já consolidado.
“A PEC 45 é muito mais dogmática, no sentido de só tratar da tributação sobre o consumo. Ela busca responder a essa questão da justiça fiscal com alguns elementos que eles chamam de IVA-P, que é o IVA particular: aquele contribuinte que tiver um rendimento baixo depois vai ter uma parte do IBS devolvido. Mas, a nosso ver, precisamos ter uma tributação sobre o consumo mais baixa, e aí não tem jeito, você precisa fechar as contas e ter aumento de tributação sobre renda e sobre o patrimônio, para ficar um pouco mais parecido com os países desenvolvidos, os países da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico]. Então precisamos torcer por uma reforma tributária que caminhe para isso”, realça Kleber.
Outra pauta defendida pelo Sindifisco é a correção da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física, que desde 1996 sofre uma defasagem de quase 104%. A correção isentaria de pagamento quem recebe uma renda de até R$ 3.881 mensais, alcançando cerca de dez milhões de brasileiros. Em estudo recente, a entidade mostrou que a defasagem na correção da tabela do IRPF é mais prejudicial para aqueles cuja renda tributável mensal é menor.
Para Kleber Cabral, a criação da Comissão Mista no Congresso é uma tentativa de solucionar o impasse acerca do protagonismo da Reforma: se cabe ao Senado, à Câmara ou ao Executivo, que “acabou não assumindo o papel que deveria”. “Não existe reformatributária sem a participação do Executivo, isso é uma ilusão. Ele que vai operacionalizar, ele que vai fazer as contas, ele que vai afiançar. Seria um enorme risco tentar caminhar uma reforma tributária sem a participação do governo. Só que o próprio governo não tem ocupado o espaço que ele deveria neste tema. Ele tem priorizado outras reformas, como a administrativa, que parece que foi colocada como prioridade”. Kleber ainda ressalta que a arrecadação sempre foi fundamental para qualquer governo.
No entanto, com a emenda do Teto dos Gastos, essa lógica foi invertida e o controle do orçamento passou a ser prioridade. “O país está em déficit fiscal pelo quinto ano seguido e deveria estar atrás de arrecadar. Mas como ele não pode mais gastar, arrecadar é bom, mas já não é mais o principal, é o secundário”. Um reflexo dessa nova conjuntura é a sequência de reformas: Previdência, Administrativa e PEC Emergencial.

“O país está em déficit fiscal pelo quinto ano seguido e deveria estar atrás de arrecadar. Mas como ele não pode mais gastar, arrecadar é bom, mas já não é mais o principal, é o secundário”
Kleber Cabral, presidente do Sindifisco Nacional
Como resultado geral das propostas defendidas pelo Sindifisco, a arrecadação ganharia um incremento estimado superior a R$ 13 bilhões. “Os dois projetos apresentados no Congresso tratam da tributação do consumo, portanto, nossa proposta não colide com nenhum deles, mas os complementa”, diz Kleber Cabral, acrescentando que não existe nação desenvolvida sem uma administração tributária forte e sem a valorização do Auditor-Fiscal.