
Apresentado pelo senador Roberto Rocha (PSDB-MA) no dia 5 de outubro, o relatório da Proposta de Emenda à Constituição 110, que trata da Reforma Tributária no Senado, trouxe uma vitória histórica para os Auditores-Fiscais e para a Receita Federal: a previsão constitucional da Lei Orgânica do Fisco (LOF). A inclusão do tema nas discussões foi resultado de um trabalho realizado pela atual gestão do Sindifisco Nacional em parceria com diversas entidades do Fisco e que também contou com a assessoria do ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), autor intelectual da PEC 110.
Caso seja aprovada, a proposta deverá alterar o parágrafo 3º do artigo 145 da Constituição Federal, determinando que “lei complementar estabelecerá normas gerais aplicáveis às administrações tributárias da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, dispondo sobre deveres, direitos e garantias dos servidores dos cargos exclusivos de Estado das carreiras mencionadas no inciso XXII do artigo 37”. Ainda hoje sujeitos à arcaica Lei 8.112/90, que não contempla as peculiaridades do cotidiano funcional do cargo, os Auditores-Fiscais terão, finalmente, um importante arcabouço jurídico que estabelece garantias e prerrogativas para o pleno exercício de suas atribuições.
Para o Sindifisco Nacional, a LOF representará uma mudança de patamar para o cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal. “A LOF é um desejo e um objetivo da classe há bastante tempo, e conseguimos colocar a sua previsão agora na PEC 110. A Lei Orgânica trará segurança jurídica para nossa atuação. Ela contemplará direitos, prerrogativas e deveres para que possamos superar uma série de dificuldades que enfrentamos em nosso cotidiano. É um grande passo que conseguimos dar e vamos trabalhar para que ele se concretize”, diz o vice-presidente da entidade, Ayrton Bastos.
O diretor de Assuntos Parlamentares, George Alex de Souza, explica que, em vez de tentarem incluir suas contribuições de forma isolada, as entidades do Fisco decidiram montar um texto que representasse um consenso. A primeira reunião foi realizada no início de 2019. “Estabelecemos como prioridade a previsão da lei complementar, até porque, dentro dessa lei complementar, podemos tratar da autonomia administrativa, financeira, patrimonial e orçamentária dos órgãos do Fisco, seja no âmbito federal, estadual ou municipal”.
George observa que o tema apareceu pela primeira vez na PEC 186/2007, que previa a autonomia dos Fiscos e a lei complementar, com a inclusão de dois parágrafos no artigo 37. “Só que essa PEC não andou. Não teve apoio político. Desta vez, nos reunimos em torno de um texto, fortalecemos nossa ação a partir da união de todos os agentes do Fisco, dialogamos com o relator e com outros atores importantes, e conseguimos o apoio para a previsão dessa lei complementar”.
Na lei complementar, serão tratados os direitos, deveres e garantias para os membros do Fisco e proteção jurídica para a própria Receita Federal. “Em termos de segurança jurídica, é um avanço inequívoco, e o fato de estar em lei complementar significa que não poderá ser alterada amanhã ou depois por uma Medida Provisória. Então, isso representa uma segurança maior e garante que não seremos surpreendidos com uma MP, da noite para o dia, invadindo a seara do Fisco federal”, complementa George.
Entrevista com o ex-deputado Luiz Carlos Hauly

A PEC 110/2019 tem conteúdo idêntico ao substitutivo aprovado na Comissão Especial da PEC nº 293/2004, da Câmara dos Deputados, em dezembro de 2018, que teve como relator o ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly. O economista falou à revista Nova Integração sobre a tramitação da proposta e a importância da Lei Orgânica do Fisco.
Como foi realizado o trabalho parlamentar visando à inclusão da previsão da LOF na PEC 110?
Esse diálogo com os Fiscos do Brasil começou em 2016, quando fui relator da PEC 293/2004. Como sou um homem público, um economista, com uma visão completa do Estado e da sociedade, entendia que para fazer qualquer Reforma Tributária você tem que ouvir e atender os principais agentes envolvidos no processo. Uma Reforma Tributária envolve um pacto social, entre os governos – federal, estaduais e municipais –, e a sociedade, e um pacto federativo entre os estados, os municípios e a União. Estabelecemos regras de ouro: não mexer com a carga tributária da sociedade e com a arrecadação da União, dos Estados e municípios; e observar a presença de todos os agentes envolvidos no sistema tributário brasileiro, que é a estrutura, o comando constitucional que vai prover os recursos para os orçamentos da União, dos estados e municípios, e vai garantir os recursos nacionais para o país.
Então começamos a trabalhar do lado dos empresários e do lado dos trabalhadores. E dentre os trabalhadores, os do Fisco, que são encarregados dos sistemas de tributação, arrecadação e fiscalização, que são estruturas fundamentais à sobrevivência do Estado brasileiro. Não tem como fazer uma Reforma Tributária sem adequar essa estrutura àqueles que serão os responsáveis pela arrecadação, fiscalização e tributação. Daí surge um diálogo com os Fiscos muito produtivo. As cabeças pensantes dos sindicatos dos Auditores são privilegiadas, são uma elite.
A presença da LOF na Constituição é regra fundamental, assim como o tratamento diferenciado para micro e pequenas empresas, para o cooperativismo. E somente esse acolhimento global viabiliza uma reforma tão grande e tão importante. Tudo isso estava incluído desde a PEC 293, que está prontinha para ser votada na Câmara desde 2018. Quando ela foi sobrestada pelo então presidente da Casa, Rodrigo Maia, que optou por começar uma nova PEC do zero, peguei essa PEC 293, que eu tinha redigido, com apoio, e enviei para o Senado, que a acolheu por unanimidade, com assinatura de 80% dos senadores, surgindo a PEC 110. Nela também estava contido o acolhimento dos Fiscos do Brasil.
Qual a sua expectativa em relação à tramitação dessa proposta que inclui a LOF?
A previsão da LOF já está incluída no relatório do senador Roberto Rocha. Nosso objetivo agora é aprovar esse relatório. Nós temos que dar as mãos, os empresários de todas as atividades econômicas, os trabalhadores de todas as atividades laborais, os Fiscos, e abraçar a aprovação do texto, que vai ser uma grande mudança de paradigma na economia brasileira. Vai ser benigno para todos.
A Reforma Tributária é um ganha-ganha, para governo federal, estados, municípios, Fiscos, sociedade e empresários, porque vamos eliminar todos os problemas que foram detectados ao longo dos anos, que são os efeitos indesejados, as mazelas do atual sistema tributário brasileiro, que é considerado o pior do mundo. É o sistema tributário que tem uma das maiores inadimplências de pagamento de impostos, sonegações de impostos e maior custo burocrático do mundo. É um sistema altamente danoso para a competividade e para a economia de mercado brasileira. Aprovando a PEC 110, o Brasil ganha.
Na sua avaliação, qual a importância da Lei Orgânica do Fisco?
Eu encaro como uma introdução fundamental. Você não pode fazer uma reforma sem que as partes estejam acolhidas no texto: o governo federal, os estados, os municípios, os setores produtivos, as micro e pequenas empresas, e o Fisco também. Tem que haver o respeito ao papel fundamental que é tributar, arrecadar e fiscalizar. Em todos os países do mundo existe esse respeito. A qualidade principal da PEC 110 é o acolhimento das contribuições da Câmara, do governo federal. Então ela está completa, e por isso passa a ser a PEC dominante. Não tem quem não tenha sido acolhido. Atende todos os requisitos do IVA da OCDE. Será um IVA dual, no modelo canadense. Temos especialistas no IVA canadense, ouvimos o pessoal do IVA da OCDE, estados, municípios, União, todo o setor produtivo brasileiro, indústria, comércio, serviços, e procurou-se aparar todas as arestas sem perder o conteúdo central de ser um IVA nacional, dual. O tripé é simplificação, tecnologia 5.0 de cobrança e justiça fiscal de forma fraterna e solidária.
O que podemos esperar com a aprovação da PEC 110?
A aprovação da Reforma Tributária significa o início da recuperação da economia brasileira. Sem ela, o Brasil não vai sair da crise econômica e fiscal em que se encontra, vai continuar crescimento tipo “voo de galinha”, cresce um ano ou dois, e cai. Com a Reforma Tributária, o Brasil vai voltar a ter crescimento econômico sustentado e perene, a ser competitivo, porque ela vai diminuir o custo de produção das empresas e da contratação de mão de obra, aumentar o salário líquido dos trabalhadores, com a diminuição de encargos, diminuir a mortalidade de empresas, gerar milhões de novos empregos, diminuir o desemprego estrutural e o subemprego, e aumentar o poder de compra das famílias brasileiras. Se não votar ainda esse ano, o Brasil já perde mais um ano, pois em 2022 a previsão de crescimento é de 1%, e caindo a cada dia. Se aprovar ainda esse ano, no Senado, esse panorama para o ano que vem já muda.