Modelo de assembleias telepresenciais ganha força com crise sanitária

A população mundial nunca esteve tão dependente das conversas por vídeo. No distanciamento social provocado pela Covid-19, essa forma de comunicação não só ameniza o trauma do confinamento como evita a paralisação de determinados setores da economia. Mas, além de preservar empregos e aproximar familiares, os recursos audiovisuais despontam como solução viável para manter a luta em defesa do serviço público no Brasil.

Neste período de excepcionalidade, as ferramentas de teleconferência representam para o Sindifisco Nacional um instrumento capaz de manter a classe mobilizada diante dos desafios que recaem sobre os Auditores-Fiscais. Até porque a quarentena imposta à maioria dos brasileiros não cessou os ataques constantes à classe e, de maneira mais ampla, à totalidade dos servidores públicos.

Diante da pandemia de coronavírus, as assembleias telepresenciais, concebidas em caráter complementar ao modelo habitual de assembleias, podem significar “a única maneira de o sindicato continuar funcionando, levando em conta a opinião da classe”. A avaliação é do diretor-secretário do Sindifisco Nacional, Paulo Roberto Ferreira.

As reuniões virtuais foram idealizadas como alternativa aos encontros presenciais para quem tem dificuldade de deslocamento até as sedes das Delegacias Sindicais ou ainda está em horário de trabalho no momento das reuniões. O desafio é democratizar a participação nesses encontros e garantir o maior quórum possível entre os quase 23 mil filiados.

É um desafio e tanto, já que esse número supera a população de cerca de 70% dos municípios brasileiros, de acordo com dados do IBGE. Atender a um público tão expressivo demanda planejamento logístico e orçamentário, sobretudo por se tratar de democracia direta, em que cada filiado não apenas vota, mas faz questão de ver e ser visto, de ouvir e ser ouvido.

Para superar esse desafio, foi necessário estipular um prazo para adesão ao novo sistema de assembleias telepresenciais, encerrado em 31 de dezembro de 2019, a fim de que cada DS fizesse a opção. Das 84 Delegacias Sindicais, 58 aderiram ao modelo. “Aceitamos a proposta desde o início. Sabíamos da importância dessa ferramenta tendo em vista que temos muitas unidades aqui em Recife. Sabíamos que com essa opção iríamos conseguir maior presença nas assembleias”, explica a vice-presidente da Delegacia Sindical de Recife, Juliana Galvão.

A Delegacia Sindical do Mato Grosso do Sul também faz parte do rol de aderentes à nova ferramenta. “Historicamente temos um bom número de filiados em assembleia, mesmo assim houve uma ótima receptividade. Aprovamos aqui por unanimidade, por ativos e aposentados. Tanto colegas da capital quanto do interior disseram gostar da ideia”, relata o representante sul-mato-grossense, Anderson Novaes, que também é presidente da mesa do Conselho de Delegados Sindicais do Sindifisco Nacional.

Em contrapartida, Delegacias Sindicais como a do Rio de Janeiro preferiram manter a exclusividade das assembleias presenciais. O Auditor-Fiscal Alexandre Monteiro afirma ter se frustrado com a decisão. “Quem já foi a uma assembleia da DS/Rio sabe muito bem como funciona. Quem tem pensamento diferente não tem possibilidade de falar, de se posicionar, pois de imediato já vêm as vaias e palavras de ordem. E após alguém conseguir expor, logo vem alguém do grupo retrucar e começam os aplausos e gritos. Não é discussão de ideias, é torcida organizada. Transformam a assembleia em circo. Dessa forma, as pessoas mais introvertidas e que não gostam de confusão se afastam das assembleias”, relata.

A partir da definição do quantitativo de participantes, a Direção Nacional e o Departamento de Tecnologia da Informação do Sindifisco Nacional passaram a implementar o sistema de assembleia telepresencial, que inclui o aplicativo Zoom, referência em reuniões virtuais. A ferramenta permite conversas por vídeo em alta definição, com áudio de qualidade. Os recursos de colaboração abrangem compartilhamento de tela. As reuniões online, com capacidade para até mil participantes, podem ser gravadas e assistidas por quem não participou. Tudo isso por computador ou aplicativo disponível para iPhone e Android.

Muito embora o prazo para adesão ao sistema tenha terminado em dezembro do ano passado, a nova realidade do coronavírus fez a Direção Nacional reabrir esse prazo durante o mês de abril, a partir de uma sugestão da Delegacia Sindical de Taubaté (SP). “Nesse momento de crise causada pela pandemia, resolvemos reabrir o prazo para que as demais DS fizessem a adesão ao sistema de assembleias telepresenciais. Após isso, realizamos o treinamento de forma online para que todos os dirigentes locais tivessem condições de realizar suas reuniões e promover as deliberações necessárias junto a seus filiados”, explica Paulo Roberto Ferreira.

O recurso das assembleias telepresenciais é uma forma de manter a classe unida na discussão de temas já conhecidos dos Auditores-Fiscais, mas também de inaugurar o debate de assuntos que surgiram no contexto do novo coronavírus. A apreensão em face de um vírus ainda desconhecido é revelada em áreas como o Porto de Santos, onde trabalha o Auditor-Fiscal Flávio Prado. “Os Auditores-Fiscais da Alfândega que estão em grupos de risco foram deslocados para teletrabalho, de forma a diminuir a possibilidade de infecção. Ainda assim, a situação continua preocupante, já que, devido à falta de concursos, a idade média dos Auditores que atuam na unidade é relativamente alta”, afirma Flávio.

As deliberações em sessões virtuais são uma realidade consolidada no Brasil. Estão em diversas instâncias do Poder Judiciário, em nível estadual e nacional. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça realizam julgamentos em plenários virtuais. Até mesmo tribunais de contas aderiram às deliberações online. “O próprio Congresso Nacional já adotou o Plenário Virtual para continuar suas atividades”, reforça Paulo Roberto, em referência à Câmara e ao Senado, que aprovaram, em caráter de urgência, um projeto de resolução para liberar a votação remota de propostas legislativas durante o período de pandemia do coronavírus.

Por questões logísticas ou por causa da Covid-19, modernizar métodos e processos exige esforço de adaptação. Mesmo antes do coronavírus, a Direção Nacional enfrentou resistência para aceitação das assembleias telepresenciais. “Inicialmente, houve uma rejeição com base em dois argumentos: o comprometimento dos debates nas assembleias telepresenciais e o desinteresse e dificuldade dos aposentados, especialmente os mais antigos, no manuseio de novas tecnologias”, ilustra o presidente da DS Espírito Santo, Luciano Teixeira. “Porém, após os esclarecimentos sobre a utilização dos recursos e a disseminação do hábito das videoconferências em nossa cultura organizacional, creio que esses obstáculos ficaram superados”.

“Diante de um momento impensável que o mundo está vivendo, faz-se necessário termos a opção de caminhos digitais. A própria Receita Federal se viu impelida a levar o máximo de Auditores e Auditoras para o trabalho remoto. Garantir a comunicação via ferramentas seguras vai agregar muitos colegas que estão distantes das decisões sindicais”, complementa Dauzley Miranda, presidente da DS/Recife.

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